segunda-feira, 10 de outubro de 2011

Recordando tempo que não volta…

           Habituado a escrever sobre problemas políticos da vida quotidiana nacional e citadina, vou hoje alterar a norma fugindo à rotina, para me fixar dessa vez em casos concretos, ou seja, trazendo ao domínio público um “conto real” que vivi oportunamente, e que ocasionou na minha mente, uma reflexão profunda e fez explodir toda a sensibilidade do meu pensamento.
         Apreciador intransigente de valores tradicionais, hoje muito arredados da sociedade decadente em que vivemos, e os quais, na minha óptica, são factor fundamental para o evoluir correcto de qualquer geração, corro o risco de provavelmente ser considerado um “velho do Restelo”, dado que a actual juventude, por deficiência de educação, vive de forma totalmente diferente, sem saber verdadeiramente que valores tradicionais são baluarte de qualquer sociedade.
         Feito esse preâmbulo, passo a narrar o sucedido.
         Certa manhã, na sequência rotineira da minha condição de reformado, fui como de costume encontrar-me com um grupo de amigos, que denomino de “brigada do reumático”. Esse encontro é feito normalmente num café da nossa cidade; a coesão entre nós tem valor significativo, pois quando alguém do grupo falha, a preocupação é grande, porque amamos a vida, embora sem grande temor à morte, e quando perdermos um amigo, também morrerá um pouco de cada um de nós.
         Nesse dia a que me estou a referir, a rotina foi quebrada com a presença de pessoas não habituais naquele local, cuja juventude oscilava entre os 65 e 70 anos de idade, os quais irradiavam olhares brilhantes de alegria, constatando eu que, cada vez que mais uma pessoa se juntava a eles, os abraços eram efusivos, sinceros, e neles transbordavam imenso prazer. Obviamente que a minha curiosidade já não tinha limites, e indagado vim a saber que se tratava de um grupo de ex-alunos do Curso Geral do Comércio (2º ano, 2ª turma de 1951), que todos os anos se reúnem num almoço de confraternização, para reviver o passado e assim, recordarem o tempo vivido na escola que os transportou para a “universidade da vida”.
         Embora não fazendo parte do grupo, também eu fiquei feliz, pois recordar o passado faz parte do presente e prepara o futuro; quem assim não pensa, esquece o tempo maravilhoso da nossa juventude e os momentos excepcionais que vivemos na escola, onde despreocupados não sabíamos ainda aquilo que o futuro nos reservava. Aquele momento me ocasionou um dia diferente, pois inclusive tive a oportunidade de conhecer alguém, filha de um velho conhecido, que me fez recordar o pai, dada a semelhança fisionómica com a sua origem.
         Acredito ainda em valores tradicionais que se esfumaram no tempo, por isso recordo com saudade os meus tempos de escola, onde adquiri conhecimentos básicos que ainda hoje me são úteis, apesar de com 86 anos estar terminando o meu prazo de validade.
         Neste dia diferente, também eu revivi os meus tempos de escola, professores e colegas (a maioria deles já falecidos). Constatei com tristeza a diferença entre gerações, pois então, o respeito por quem nos ensinava, tinha real valor ao limite de, já casado e com filhos, beijar a minha professora, com sincero respeito e carinho, como reconhecimento por tudo que me ensinou.
         Termino este “conto real”, felicitando esse grupo de antigos alunos que, reunidos uma vez por ano, não esquecem valores que para mim, constituem baluarte duma sociedade que, ignorando-os, vai caindo em decadência… Estou convicto que nesse dia, todos eles se sentiram rejuvenescidos, recordando tempo que não volta, razão forte e humana para sentir nostalgia. Se porém, te chamarem velho, reage com indignação, pois  já tens a vantagem e a certeza, ele a terá ou não.

António Fernandes Ferreira

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